Cartografias do Cárcere: por uma Microfísica do Encarceramento
Pautando-se na Cartografia como método, o trabalho se dispõe a inserir o território prisional em um plano cartográfico investigativo. O objetivo central é compreender como o dispositivo prisional molda o corpo e a subjetividade dos encarcerados, por meio de uma análise rizomática e dinâmica do espaço e do tempo carcerários. A partir da vivência do próprio pesquisador dentro de um presídio, está em uso como disparador e fonte de dados primários o arquivo reunido no período, sendo este composto essencialmente de escritos do próprio pesquisador e de outros internos, de objetos recolhidos durante o período do cárcere, e das memórias afetivas do corpo-prisioneiro. Os dispositivos elencados para mapeamento incluem: uma heterotopografia do espaço físico e do tempo prisionais; a proposta de um ciclo de despersonalização e reconstrução de identidades (rostificação) prisional efetuado em fases da vivência carcerária; as passagens do devir-ferro, do devir-grama e do devir-nada. Além disso, visando trazer à tona as especificidades do contexto prisional brasileiro, o estudo propõe uma ressonância entre as vivências individuais e as dinâmicas prisionais descritas por outros estudiosos e detentos, situando a experiência carcerária dentro de uma análise comparativa mais ampla. Em relação aos conceitos centrais que se propõe articular e, de certa maneira, reconfigurar para o contexto da pesquisa em prisões, destacam-se aqueles encontrados principalmente nas obras de Erving Goffman, Donald Clemmer, Gresham Sykes, Gilles Deleuze, Félix Guattari e Michel Foucault. Tais conceitos são mobilizados e adaptados de modo a refletir as complexas relações de poder, resistência e subjetivação que emergem no ambiente prisional. O trabalho procura se manifestar em uma categoria análoga à Convict Criminology, movimento acadêmico-social que vem se consolidando em outros países onde os saberes produzidos por detentos e egressos são colocados em destaque de maneira complementar às formas tradicionais de produção de conhecimento acadêmico. Dessa forma, a pesquisa contribui para o fortalecimento e ampliação desse campo no Brasil, evidenciando a importância de vozes que emergem a partir da experiência carcerária direta.