Função Social da Propriedade Urbana e o Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC): uma análise crítica a partir de três experiências de aplicação
O debate em torno dos limites e possibilidades do Projeto de Reforma Urbana tem sido alimentado pelos resultados de estudos recentes que tratam da implementação da agenda urbana instituída pelo Estatuto da Cidade. Partindo-se do pressuposto de que tais estudos têm potencial para revelar outras condicionantes que podem lançar luz sobre o impasse e a complexidade em torno de sua efetivação, além daquelas abordadas por diversos autores, especialmente no campo teórico, a presente pesquisa tem como objeto de estudo a aplicação do Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC) e de seu sucedâneo, o IPTU progressivo no tempo do ‘PEUC’ em três municípios: São Paulo e São Bernardo do Campo, no Estado de São Paulo, e Maringá, no Estado do Paraná.
Para compreender as experiências de aplicação foram identificados, por meio de pesquisa documental e entrevistas, o contexto (ou ambiente) local que possibilitou o início e o avanço da implementação do PEUC, o universo notificado, e a reação dos proprietários em resposta às obrigações impostas pelo instrumento. A partir dos Estudos de Caso foi possível aprofundar a análise sobre as finalidades associadas à aplicação do PEUC e identificar em que medida os objetivos pretendidos foram alcançados, priorizando-se conhecer e registrar o rebatimento dos efeitos iniciais no território e sua relação com o ideário reformista.
A investigação contou também com análise e leitura transversal dos três casos, com o objetivo de identificar semelhanças e diferenças nas experiências estudadas, mas principalmente conhecer as condicionantes que favoreceram a aplicação do PEUC e comprometeram sua continuidade. O olhar transversal sobre experiências em contextos urbanos diversos confirmou a hipótese da pesquisa de que a aderência do PEUC ao conjunto da legislação urbanística vigente e a sua articulação e sobreposição com os outros instrumentos urbanísticos constituem-se em uma das principais condicionantes para o (potencial) alcance dos objetivos pretendidos. Por outro lado, observou-se a existência de outras condicionantes que favorecem ou restringem o alcance dos possíveis resultados esperados, em maior ou menor grau: os aspectos físico-territoriais e as especificidades histórico-geográficas que moldaram a formação e o desenvolvimento urbanos, e que implicam nas características e dimensão do estoque ocioso disponível em cada caso; a condição política e a prioridade do PEUC na agenda local, com destaque para o perfil dos prefeitos na decisão pela aplicação, além do arranjo institucional em torno da implementação dos instrumentos.
O olhar através das ‘janelas de oportunidade’ abertas pelos poucos casos de aplicação do PEUC no país ilumina (ou lança luz sobre) o processo não linear que envolve agentes públicos e privados no desenho e implementação da política urbana e reforça a importância da escala local como arena de disputa em tempos de neoliberalização.