A concepção terapêutica de filosofia de John McDowell: entre a leitura de Wittgenstein e Mente e Mundo
A presente pesquisa tem como objetivo apresentar a noção de terapia filosófica tal como ela é adotada enquanto um procedimento de crítica filosófica específico na filosofia de John McDowell. Para delinear essa noção, considero necessária as seguintes etapas.
Na primeira parte da pesquisa, é preciso rastrear de onde e por quais razões McDowell adotou este procedimento específico em detrimento do que chama de filosofias construtivas ou teóricas. Para dar conta deste primeiro passo, me voltarei à leitura que McDowell faz de Wittgenstein. Mais especificamente, mostrarei como a postura terapêutica de McDowell deve ser (i) localizada em sua interpretação do tema do seguir regras em Wittgenstein on following a rule (1984), (ii) e que tal leitura pode ser, em seguida, contextualizada a partir de textos de cunho metodológico de McDowell, quais sejam, Wittgensteinian “quietism”? (2009) e Philosophical Method (2015). Nesta primeira etapa, mostraremos que a terapia filosófica de McDowell se constitui pelos seguintes passos:
(1) identificação daquilo que é considerado como um problema filosófico pelo interlocutor/paciente da terapia (e.g. como é possível a objetividade do significado; como é possível a coerção normativa do significado; etc.);
(2) explicitação dos problemas da posição adotada pelo interlocutor que impedem com que aquilo que ele considera como um problema filosófico possa ser solucionado através de uma determinada teoria filosófica;
(3) dissolução do problema e da posição adotada ao mostrar como os termos do problema podem ser rearranjados em um novo quadro conceitual no qual isso deixa de ser problemático. Este novo quadro é o objetivo da terapia filosófica, o qual McDowell chama de cura.
Na segunda parte da pesquisa, analisarei de que modo a introdução, a segunda e a quarta conferências de Mente e Mundo (1994) podem ser consideradas como um exemplo de tal procedimento terapêutico de matriz wittgensteiniana. Procederei do seguinte modo. Em primeiro lugar, identificarei como o modelo terapêutico delineado na primeira parte da pesquisa aparece na introdução do livro. Aqui, (1) McDowell encontra uma “ansiedade mais profunda” [deeper anxiety] que se configura na forma de um problema filosófico de tipo “como é possível?”. Em seguida, (2) ele apresenta como as possibilidades de resposta tem como consequência a inviabilidade de cada uma delas. Por fim, (3) McDowell oferece uma cura à ansiedade, de modo que a questão “como é possível?” é completamente “exorcizada” e, portanto, deixa de ser problemática. Em segundo lugar, mostrarei como o procedimento encontrado na introdução, que reflete a noção geral de terapia em McDowell, se apresenta em uma análise dos capítulos II e IV, que culminam em duas formulações de “cura”, a “indelimitação do conceitual” e a “segunda natureza”, respectivamente.