Negatividade para além da dialética — sobre o objeto a
Esta pesquisa teve como tarefa avaliar a negatividade dialética — em seus pressupostos, compromissos, potências e limites — a partir da negatividade apresentada por Jacques Lacan em seu ensino, principalmente quando tematiza o objeto a e o real no início dos anos 1960. Esta tarefa se coloca para averiguar uma dúvida instalada pelo filósofo Ernesto Laclau acerca da potência revolucionária da dialética em Marx, o que faz ao afirmar que a ela não permite nenhuma negatividade constituinte ou radical, apenas negatividades normatizadas em um espaço de representação mais amplo e alienadas ao conceito. Esta avaliação a partir da teoria lacaniana se justifica aqui tanto pelas críticas que o psicanalista fez e possibilita fazermos a Hegel e a qualquer lógica e compreensão de negatividade fiada na razão (enquanto racionalidade e proporção), quanto na aposta teórica de Laclau que vê no lacanismo e em seus efeitos filosóficos novas possibilidades para concebermos a negatividade filosófica e politicamente. Para realizar tal programa, esta pesquisa dividiu-se em duas partes: uma primeira, na qual foi reconstruída a invenção lacaniana do objeto a partindo da montagem e da desmontagem do “desejo puro”, de maneira a acompanharmos como Lacan diagnosticou e lidou com os impasses da lógica fálica-significante que oferecia apenas negatividades investidas simbolicamente e como respondeu a isso com a invenção de um objeto e de uma negatividade fora do pensamento, da representação e do conceito, o a. Em um segundo momento, analisou-se tanto os pressupostos dialéticos quanto suas operações ou, em termos althusserianos, suas “estruturas básicas de determinação”. Mostrando como tal lógica, embora seja tomada como transformativa e negativa, apenas mantém o mesmo em sua total inteligibilidade. Ao fim desta segunda parte, passamos, mais especificamente, ao caso marxista, indicando, além de suas balizas para a aplicação da dialética em um campo materialista não especulativo, como o marxismo sustenta-se em uma posição ambígua: ao mesmo tempo inaugura nas ciências modernas um campo tenso e conflituoso postulando as lutas de classes, enquanto normatiza este empreendimento em uma disciplina que reduz a negatividade possível e revolucionária na contradição categorial. Um tratamento foi dado a isso com a noção de antagonismo em Laclau, que permite sustentar as lutas de classes a partir de outros referenciais teóricos e bases epistemológicas muito próximos às conquistas lacanianas do objeto a e do real, mostrando uma potência até então minada pelos pressupostos dialéticos hegemônicos no marxismo.