DE VOLTA AO ‘FRONT’
O debate sobre o novo consenso macroeconômico no pós-crise
Os anos 1970 foram marcados por uma profunda cisão na pesquisa macroeconômica. A pax firmada em torno da síntese neoclássica deu lugar a uma intensa disputa substantiva e metodológica, opondo keynesianos tradicionais e novos clássicos. Substantivamente, essas escolas divergiam sobre a natureza do trade off entre inflação e desemprego e sobre a eficácia da política monetária. Metodologicamente, divergiam sobre o lugar dos microfundamentos e do realismo nos modelos. Robert Lucas foi um dos principais arquitetos do novo padrão metodológico. A sua estratégia de microfundamentação tinha inspiração walrasiana. Assumia que o equilíbrio, mais do que uma hipótese fundamental, seria uma disciplina a ser perseguida pelos economistas. Nos anos 1980, o padrão metodológico de Lucas foi incorporado à pesquisa dos ciclos reais de negócios. Na versão mais purista desses modelos, derivados sem nenhuma referência a choques nominais, o programa iniciado por Lucas alcançou o seu ápice. Nessa mesma década, o keynesianismo tradicional reencarnaria num corpo de musculatura microfundamentada, reclamando a presença de premissas como a rigidez de preços. Quando os macroeconomistas se voltaram a enxertar as premissas keynesianas nos modelos desenvolvidos pelos teóricos dos ciclos reais de negócios, a pesquisa macroeconômica convergiu, mais uma vez, para uma agenda comum. Proclamado o novo consenso, ambos os lados puderam cantar vitória. Na virada do milênio, a macroeconomia moderna colhia os louros da Grande Moderação e jactava-se de moldar a política econômica. Mas não tardou para que os flancos abertos do novo consenso fossem expostos. Tendo surpreendido boa parte economistas, a crise financeira de 2008 abalou a reputação da ciência econômica e deu azo ao surgimento de novos dissensos e ao ressurgimento de outros velhos. No centro das críticas, destaca-se a simplicidade com que os modelos da nova síntese – os chamados DSGEs – tratam o mercado de crédito e as conexões das finanças com a economia real, algo que mesmo os próceres do novo consenso não relutam em reconhecer. Ressurge também a discussão sobre o tipo de simplificação adotado pelos modelos – se faz sentido ou não abstrair justamente aqueles mecanismos que fornecem respostas sobre as flutuações mais profundas da atividade econômica. Algumas críticas miram a reconstrução da disciplina. Nos artigos escritos por Joseph Stiglitz, chegam a condenar os modelos DSGEs nos mesmos termos com que os novos clássicos condenaram a velha síntese neoclássica. Outras críticas buscam uma contemporização, reconhecendo a necessidade de haver mais de um tipo de modelo, desde que preservado o espaço para os DSGEs. É o caso de Olivier Blanchard, um dos arautos da autocrítica.