DESENVOLVIMENTO DA REDE DEFAULT MODE E ADVERSIDADES AMBIENTAIS EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES: UM ESTUDO DE IMAGEAMENTO FUNCIONAL EM RESTING STATE
Grande parte das experiências infantis acontecem no primeiro ambiente de socialização da criança, que é o ambiente familiar. A qualidade das relações desenvolvidas neste ambiente parece ser crítica para o desenvolvimento da criança. Apesar disso, poucos estudos têm investigado o impacto da qualidade dessas interações sobre a rede default mode. Estudos sugerem que a qualidade do ambiente familiar e do cuidado parental são potenciais moduladores do funcionamento cerebral, assim como da afetividade e do comportamento infantil.
Nesta tese, testamos as associações destas interações sobre a atividade regional e a conectividade funcional da DMN e suas associações com o comportamento de crianças e adolescentes (6-15 anos), assim como verificamos associações com a taxa de encurtamento dos telômeros, considerado um promissor marcador biológico de estresse nos indivíduos. Para isso, realizamos três estudos apresentados na forma de artigos, o primeiro e o segundo já publicados. O primeiro é uma revisão da literatura para obter um panorama do estado da arte a respeito do desenvolvimento da DMN e sobre as variáveis ambientais que o afetam. No segundo a proposta foi identificar se existe alguma interação das variáveis ambientais familiares com a atividade regional espontânea da DMN e o comprimento dos telômeros dos leucócitos periféricos. O terceiro investiga possíveis associações entre variáveis ambientais (relacionadas ao funcionamento familiar e ao cuidado parental) e o desenvolvimento da conectividade funcional DMN em crianças e adolescentes.
A tese foi desenvolvida a partir da análise dos dados coletados pelo Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento (INPD), especificamente com crianças e adolescentes do Projeto Brazilian High-Risk Cohort (HCR), consideradas saudáveis mas com alto risco de desenvolvimento de transtornos mentais. Foram analisadas imagens de ressonância magnética funcional em estado de repouso (rs-fMRI) com dados cerebrais de 615 indivíduos, medidas do DNA em amostras de sangue, escalas de avaliação do ambiente familiar e entrevistas estruturadas com os cuidadores.
Nossos resultados apontaram associações entre a atividade espontânea da DMN e variações na qualidade do ambiente familiar (incluído o cuidado parental), bem como sobre a taxa de encurtamento dos telômeros. Relações familiares parecem afetar significativamente a ativação espontânea da DMN e sua conectividade funcional. Além disso, o ambiente adverso associa-se com o comprimento dos telômeros e com a atividade neural da DMN, sugerindo que o ambiente possa ser um modulador biológico da mesma, embora não tenha sido possível determinar quando tal modulação ocorreu (prévia ou posteriormente à exposição ambiental). A verificação dessas associações sugere um papel fundamental do ambiente familiar no neurodesenvolvimento e fornece dados relevantes para que estudos futuros aprofundem a compreensão de como fatores relativos ao ambiente familiar interferem efetivamente na trajetória do neurodesenvolvimento típico e atípico da DMN.