Soberania à venda: as contradições políticas do capitalismo financeiro
A presente pesquisa tem como objetivo propor uma contribuição conceitual para a compreensão das tendências de crise inscritas no capitalismo financeiro. Trata-se, portanto, de desdobrar as consequências teóricas da seguinte hipótese: o processo de financeirização das economias foi responsável por refuncionalizar os aparelhos políticos dos Estados nacionais. Convertidos em plataformas de valorização do capital financeiro, os Estados veem esvaziado o conteúdo de seus processos políticos, o que significa, consequentemente, a perda da capacidade de produção de legitimidade. Se o capitalismo democrático consistiu-se como um arranjo no interior do qual a forma política criou condições de legitimação dos processos de acumulação pela produção de engajamento nos processos decisórios, o esvaziamento do conteúdo político desses mesmos processos implica um curto circuito no interior dessa forma social. A crise da democracia traduz-se, portanto, como crise do capitalismo democrático e como expressão das contradições inscritas na própria ordem social reproduzida pelo capitalismo financeiro. A presente pesquisa, nesse sentido, procura explorar conceitualmente a noção de que o processo de financeirização expressa de forma aguda as contradições políticas da forma capitalista e expõe os limites imanentes de uma ordem social fundada sobre a autovalorização do valor. No primeiro capítulo, será apresentado o conceito de capitalismo como ordem social, de modo a afastar o risco de se tomar a economia em sentido demasiadamente restritivo. Entendido como ordem social, o capitalismo nomeia toda uma forma de vida institucionalizada, fundamentada sobre pressupostos políticos e sociais. Como forma de vida contraditória, no entanto, a reprodução dessa ordem social instituída implica a destruição de seus próprios pressupostos de institucionalização. Verificar a forma específica de como esse fenômeno se expressa no capitalismo financeiro é o objetivo do capítulo 2. Por fim, o olhar será direcionado ao Brasil, no capítulo 3, momento em que se ensaiará a construção de uma hipótese explicativa para as dificuldades de institucionalização do regime democrático no país, à luz de sua história recente. A ideia de contradição política do capitalismo financeiro, portanto, será a chave de leitura para o enquadramento do período. A pesquisa, além disso, procura ainda proporcionar uma ampliação do escopo teórico do campo das Relações Internacionais pela elaboração conceitual da relação intrínseca entre fenômenos locais e globais. A própria dinâmica globalizada dos processos que se desenvolvem no interior do capitalismo sob a regência da dominação financeira pressupõe a internacionalização do escopo analítico como condição necessária de qualquer observação. Advoga-se, portanto, que o campo das Relações Internacionais se constitui como plataforma privilegiada de análise da crise capitalismo financeiro e de suas consequências políticas.