DA PUNIÇÃO À EDUCAÇÃO: DISCUTINDO AS POTENCIALIDADES DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO COMBATE À VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA A MULHER NO BRASIL
Essa dissertação tem como objetivo discutir as potencialidades da Educação Básica no enfrentamento à violência sexual contra a mulher no Brasil, bem como todas as formas de violência de gênero. Adota-se uma perspectiva crítica à criminalização de condutas e intensificação de penas, que tem vigorado como principal estratégia de enfrentamento à violência de gênero no Brasil nos últimos 40 anos. A partir da compreensão de que a violência de gênero emana de uma configuração sociocultural pautada na ordem patriarcal e na assimetria de poder entre os gêneros (SAFFIOTI, 1995; 2001), e que o sistema penal é ontologicamente seletivo, tanto com relação ao criminoso quanto com a vítima, e não trata as raízes dessa violência (ANDRADE, 2005), entende-se que a via penal não se apresenta como a mais adequada forma de enfretamento. Dessa forma, faz-se necessário buscar estratégias que tratem, de fato, o cerne da violência de gênero, em especial da violência sexual contra a mulher.
Tendo em vista tal cenário, esta pesquisa defende, a partir das reflexões de Theodor Adorno, que a Educação Básica se apresenta como espaço em potencial para tratar devidamente a violência de gênero, buscando descontruir as bases sobre as quais esta se assenta. Embora o espaço escolar possa atuar como mecanismo de reprodução e manutenção do status quo (BOURDIEU, 1992), entende-se que exista neste um espaço para a resistência e oposição (APPLE, 1979). Partindo da compreensão de que o coração de qualquer empreendimento educacional é o currículo, foi realizada uma análise do texto da Base Nacional Curricular Comum (BNCC) referente à disciplina de História para o Ensino Médio Anos – Finais, onde se constatou a mudez do documento que norteia a construção curricular brasileira no que tange a reflexão e discussão das estruturas de gênero.
Embora através da análise da BNCC tenha sido constatada a mudez do documento no que se refere ao tratamento das questões de gênero, entende-se que o currículo existe em dois aspectos: o prescrito, tratando-se do documento oficial, e o real, aquele colocado em prática na sala de aula. Nesse sentido, foram realizadas entrevistas com docentes de diferentes níveis/componentes do Ensino Básico que atuam na Rede Municipal de Ensino de São José dos Campos, cidade do interior paulista. Por meio das entrevistas, constatou-se que, tal como Adorno (1995) e Apple (1979) defendem, a ação politicamente posicionada do docente em sala de aula é o elemento diferencial e que pode fazer da educação um caminho de enfrentamento à violência de gênero no Brasil.