Transferência Internacional de Políticas Públicas como Estratégia de Política Externa Brasileira: um estudo de caso da Minustah
Em 2004, após a queda do presidente haitiano, Jean-Bertrand Aristide, a Organização das Nações Unidas aprovou a criação de uma missão para estabilizar o país, batizada de Minustah. Na ocasião, a ONU concedeu o comando da operação ao Brasil, que utilizou a oportunidade para transferir políticas públicas ao Haiti, em especial derivações do Programa Fome Zero, na tentativa de resolver algumas das causas primárias que geram conflitos, como desigualdade socioeconômica e fome. O objetivo desta tese é analisar o processo de transferência internacional de políticas públicas sociais como instrumento de política externa durante as duas gestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), de modo a compreender como a agenda doméstica pode servir como forma de aumento de prestígio no sistema internacional, a partir desse diálogo com a agenda de segurança humana. Nossa proposta inclui a realização de comparação no volume de acordos de cooperação internacional assinados durante o governo Lula com seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), e com seus sucessores, a chapa Dilma Rousseff/Michel Temer (2011-2018). Esta investigação é relevante pois aborda questões fundamentais para a política externa brasileira, como a correlação da política exterior com o campo de política pública, além de analisar como um programa como o Fome Zero, por exemplo, ganhou projeção na agenda internacional do Brasil em determinado período - embora sejam assuntos que, do ponto de vista interdisciplinar, são pouco abordados pelos pesquisadores brasileiros, como a articulação entre a agenda de segurança humana com as operações de paz. Este estudo adota o método de process tracing, uma metodologia predominantemente qualitativa, mas que permite o uso de elementos quantitativo para validar as hipóteses. Uma vez que a transferência de políticas públicas é um fenômeno de difícil mensuração, optamos por um estudo de caso, a missão de paz da ONU no Haiti, como forma de focar nossa investigação em uma realidade empírica que permite sua generalização para outros casos similares. Também adotamos a aplicação de técnica de entrevista, de modo permitir que indivíduos ligados ao processo de formulação da política externa possam ajudar a preencher as lacunas da pesquisa. Do ponto de vista quantitativo, nosso estudo analisa dados da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), de modo a permitir que comprovemos a articulação das políticas públicas sociais como instrumento de política externa nos governos Lula.