Defloradas, pervertidas e abandonadas: uma genealogia da violência sexual a partir da gestão de “menores” entre as décadas de 1940 e 1950 na cidade de São Paulo
Este trabalho procurou traçar uma genealogia, ou uma de suas possíveis vertentes, do estupro no Brasil, refletindo sobre os discursos e instrumentos utilizados no controle e repressão da sexualidade feminina. Baseamos nosso estudo nos registros de prontuários de crianças e adolescentes submetidas ao Serviço Social de Menores e ao Juizado de Menores de São Paulo, no período de 1940 a 1958. Observamos as situações de “defloramento” e estupro e refletimos sobre a maneira como as meninas e adolescentes atingidas pelas violências sexuais foram tratadas, como os discursos incidiram sobre elas, assim como os instrumentos médicos e jurídicos, analisando enfim a influência dos padrões e valores morais impostos a essas meninas e adolescentes sobre suas trajetórias. A maioria dessas meninas teve seus caminhos perpassados por violências, pobreza e abandono, e suas vidas atravessadas pelos discursos que se utilizam do gênero, da classe e da raça para reafirmar preconceitos e impor controle e repressão, produzidos em regra pelas instituições, que, no entanto, deveriam zelar por seus cuidados. Voltamos a esse passado recente, de meninas e adolescentes marcadas pela violência sexual, no intuito de verificar até que ponto os dispositivos de sexualidade utilizados atualmente podem ser rastreados e analisados, identificando o contexto e momento histórico que possibilitaram sua emergência com essa finalidade.